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Oito anos depois, impeachment de Dilma ainda polariza debate sobre 'golpe' ou ato legítimo; veja o vídeo
Dilma Rousseff foi destituída em 31 de agosto de 2016, mas manteve direitos políticos; depois, perdeu uma eleição e viu a Justiça arquivar ação pelas pedaladas
BRASÍLIA - Oito anos depois, o impeachment de Dilma Rousseff (PT) da presidência da República ainda repercute na política nacional. O tema voltou à tona com o retorno do PT ao poder, após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva na eleição presidencial de 2022. Na posse do aliado, em janeiro de 2023, ela esteve no Palácio do Planalto e foi aplaudida. Também voltou ao Palácio da Alvorada, onde morou, em junho deste ano.
Em um conteúdo especial, O TEMPO Brasília detalha como foi o processo. Assista à íntegra:
Dilma Rousseff foi destituída do cargo após um processo de impeachment que se estendeu por 273 dias. O trâmite foi iniciado em 2 de dezembro de 2015, quando o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), aceitou a denúncia. O processo terminou com a leitura da sentença no plenário do Senado, em 31 de agosto de 2016. O placar: 61 votos a favor e 20 contra, sem abstenções.
Os senadores decidiram destituir Dilma do cargo, mas mantiveram os direitos políticos da petista. Antes, porém, o protagonismo pairou sobre a sessão realizada no plenário da Câmara em 17 de abril daquele ano. Na ocasião, deputados aprovaram a instauração do processo e declararam seus votos com motivos tidos como inusitados.
“Em respeito e consideração à nação evangélica”, “pela paz de Jerusalém” e “pelo fim da vagabundização remunerada” foram alguns deles. Também não faltaram agradecimentos familiares, como “à minha tia Eurides que cuidou de mim quando eu era pequeno”; além de elogios que destacaram a gestão municipal em comparação com a federal, como a que quis “mostrar que o Brasil tem jeito, e o prefeito de Montes Claros mostra isso”.
“Eu pensei que vinha para uma reunião política, mas vim para o encontro de bons maridos e bons pais”, chegou a rebater o então deputado Chico Lopes (PCdoB-CE).
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Golpe ou crime de responsabilidade?
Assim como na época, o debate sobre o "golpe" continua polarizado. Defensores do impeachment argumentam que há bases sólidas para a decisão e responsabilizam o governo Dilma pelos atos cometidos. Ela foi acusada de dois crimes: a liberação de crédito no Orçamento sem a aprovação do Congresso Nacional e o atraso nos rees de recursos a bancos públicos, conhecidos como pedaladas fiscais.
“Está na lei do impeachment os crimes de responsabilidade fiscal. Não existe golpe nenhum. Golpe existe naqueles que estão pretendendo ver um processo legítimo com ampla defesa e votado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, que não tem nada de golpe. É evidente que o PT vai sempre dizer que foi um golpe. Golpe é dizer que foi golpe, é atribuir caráter de golpe a um instrumento natural do processo político presidencialista, que é o impeachment”, diz o jurista Miguel Reale Júnior.
Ele foi um dos autores do pedido, ao lado dos juristas Hélio Bicudo e Janaína Paschoal. O julgamento se sustentou em duas principais ilegalidades. A primeira foi a acusação de crime de responsabilidade, relacionada à abertura de mais de R$ 18,4 bilhões em créditos suplementares nos anos de 2014 e 2015, sem a devida autorização do Congresso Nacional. A segunda foi a prática das chamadas “pedaladas fiscais”, que envolvia o atraso nos rees de recursos a bancos públicos para o pagamento de benefícios, entre outros compromissos.
Articuladores do impeachment
Na avaliação do advogado de Dilma no impeachment, José Eduardo Cardozo, foi um processo “não baseado em fatos”, mas que “procurava fatos”. “Não havia crime de responsabilidade, evidentemente”, citando três nomes como “os principais articuladores do impeachment” de forma “inegável”: Cunha; o então senador Aécio Neves (PSDB-MG), que perdeu as eleições para Dilma em 2014; e o vice-presidente eleito Michel Temer (MDB), que assumiu com a destituição da petista.
“Na perspectiva constitucional, a acusação é bastante frágil exatamente porque não atenta para a natureza do impeachment”, sustenta o professor Cristiano Paixão, da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). Ainda segundo ele, havia uma crise política 'inegável', mas a solução adotada foi, na avaliação do especialista, uma violação da Constituição.
“Houve uma interpretação muito rígida da lei Orçamentária para se entender que houve uma violação em relação às chamadas pedaladas fiscais. Parece, no meu entendimento, frágil, especialmente se pensarmos nas consequências desse tipo de ação, porque isso desestabiliza o sistema político. Havia uma crise política inegável, mas, no meu entendimento, a solução encontrada viola a Constituição porque não havia configuração de crime de responsabilidade”, completou.
Uma das mobilizações pela saída de Dilma da Presidência partiu do Movimento Brasil Livre (MBL). “Pode parecer para a população em geral uma coisa técnica. Mas não. Pedalada fiscal é um crime gravíssimo e leva a recessões, que faz com que as pessoas voltem à miséria, que o país regrida do ponto de vista civilizacional”, alegou o deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP), líder do MBL.
Após impeachment, um novo cenário no país
Após a destituição de Dilma, surgiu um novo cenário político que antes estava adormecido. O país ou a vivenciar uma crescente polarização caracterizada por discursos mais agressivos e pelo enfraquecimento das posições centristas. Um dos resultados foi a eleição de Jair Bolsonaro (PL) em 2018.
Representante da direita, ele derrotou o PT, interrompendo uma sequência de quatro vitórias consecutivas da esquerda nas eleições presidenciais e marcando a primeira derrota do PT em 16 anos. No entanto, há divergências sobre o crédito atribuído a essa redefinição política, com debates sobre o papel da situação que moldou o impeachment e mobilizou a opinião pública.
Hoje, Dilma atua como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento por indicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que recolocou a esquerda no poder em 2022. A petista tentou retornar antes ao cenário político, mas perdeu a eleição para o Senado por Minas Gerais em 2018.
Na Justiça, Dilma viu ser arquivada uma ação de improbidade istrativa que investigava as supostas “pedaladas fiscais” atribuídas a ela e que embasaram o impeachment. A última decisão nesse sentido foi em agosto de 2023, pela 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
“Com essa situação toda que ela viveu no impeachment, eu diria que Dilma nunca caiu como pessoa. Ela foi derrubada por um golpe como presidente, mas como pessoa saiu de pé andando e permaneceu”, conta Cardozo sobre o pós-impeachment de Dilma.