BRASÍLIA - O almirante Almir Garnier Santos, que comandou a Marinha no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), negou ter colocado sua “tropa à disposição” para um eventual golpe de Estado. De acordo com relatos nas investigações e com a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), a ação teria ocorrido em uma reunião em 7 de dezembro de 2022.
Interrogado no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (10), ele, que é réu, declarou: “Eu nunca usei essa expressão”. "Nesse contexto a que foi atribuída a minha fala, eu nunca disponibilizei tropas para ações dessa natureza”, acrescentou, sobre intenções de ruptura institucional.
Garnier afirmou que havia uma “preocupação” com a quantidade de pessoas que estavam nas ruas manifestante insatisfação com o resultado das eleições de 2022 e um receio de que isso “pudesse descambar para quebra-quebra" ou “algo que os órgãos de segurança pública pudessem vir a perder o controle”.
"Isso traria responsabilidade para as Forças Armadas. Essa era uma preocupação. Agora, as Forças Armadas sempre estão prontas para a suas missões constitucionais. Às vezes, sem todos os recursos. Mas, para isso, não há dúvida”, declarou, indicando que qualquer fala sobre suas tropas “não aconteceu no contexto em que foi imputado”.
Desfile de blindados
Almir Garnier também negou que desfile de blindados em frente ao Palácio do Planalto em 10 de agosto de 2021 tenha sido para pressionar a Câmara dos Deputados, no dia em que parlamentares decidiram o destino da PEC do voto impresso. Segundo Garnier, tratou-se de uma coincidência.
“No dia que seria votada a emenda constitucional do voto impresso, no dia em que seria votado, houve uma novidade. O senhor foi à Marinha, foi entregar um convite ao presidente da República com três blindados [...]. Foi coincidência?”, perguntou Moraes.
“Todos os anos na cidade de Formosa [Goiás] a Marinha realiza uma operação. Esse planejamento logístico leva meses de antecedências, porque esses blindados eles vêm do Rio de Janeiro. [...] Ao assumir o comando em abril, eu falei 'olha vamos fazer uma visitação pública com esses veículos aqui na Esplanada. Todo mundo pode ver. Contudo, isso não foi programado para o dia da votação no Congresso”, afirmou Garnier.
“O que eu tenho impressão é de que essa votação seria feita em uma comissão especial. O presidente da Câmara decidiu levar ao plenário e marcou para a data em que já estava marcado todo esse deslocamento. A Câmara alternou isso com cinco dias de antecedência. Neste caso em particular, foi uma coincidência”, prosseguiu o ex-comandante.
Fala sobre tropas foi relatada em depoimentos
O almirante Almir Garnier Santos foi comandante da Marinha entre abril de 2021 e dezembro de 2022, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Antes, ocupou o posto de secretário-geral do Ministério da Defesa. Ele ingressou na Força em 1978, quando ingressou na Escola Naval.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou que o militar participou de uma reunião sobre a suposta “minuta do golpe” e que a prova disso é o registro de seu nome na lista de entrada e saída de pessoas do Palácio da Alvorada, a residência oficial do presidente em Brasília.
Garnier foi apontado, nas investigações, como o único comandante das Forças Armadas que colocou sua tropa à disposição de Bolsonaro para uma suposta intervenção militar.
A adesão dele ao suposto plano foi identificada pela Polícia Federal (PF) em mensagens apreendidas no celular do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens de Bolsonaro e firmou acordo de delação premiada, e em depoimentos.
Um deles foi o ex-comandante da Aeronáutica Carlos Almeida Baptista Junior ao STF no último 21 de maio. Baptista, que ocupou o cargo no governo Bolsonaro, afirmou em depoimento que ele, o então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, e o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, tentaram “demover” Bolsonaro da intenção golpista, mas em uma reunião, "chegou ao ponto em que ele [Garnier] falou que as tropas da Marinha estariam à disposição".
O atual comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, depôs ao STF como testemunha de Garnier e disse que a Força nunca planejou colocar tanques nas ruas para impedir os poderes constitucionais. Em 2022, Olsen era chefe do Comando de Operações Navais, departamento responsável pelo emprego de tropas em águas.
Na defesa prévia apresentada ao STF no recebimento da denúncia da PGR, a defesa de Garnier negou a prática de qualquer conduta criminosa pelo almirante. "A PGR não apresentou provas mínimas de sua participação ativa ou direta nos supostos atos de violência ou na execução de quaisquer medidas contrárias à ordem constitucional", alegou.
Garnier é réu pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Somadas, as penas podem chegar a 43 anos de prisão.