Futebol e investimentos: o que embasa seu julgamento?
A influência de vieses em diferentes contextos
Marcelo Guzella é professor do Ibmec BH, doutor em controladoria e contabilidade pela USP
Padrões comportamentais podem afetar negativamente tanto decisões de investimento quanto opiniões do cotidiano. No futebol, grande paixão do brasileiro, isso não é diferente. O campeonato brasileiro mal começou e já surge uma enxurrada de opiniões de apaixonados e comentaristas de futebol. Em momentos como esse, todo cuidado é pouco para que nossos julgamentos não caiam em armadilhas mentais típicas que também aparecem nas decisões de investimento.
Estou longe de ser um especialista em esportes, mas neste artigo dou continuidade ao assunto, convidando você a refletir sobre padrões comportamentais que frequentemente estão impregnados em decisões e opiniões tanto no mundo do futebol quanto nas finanças. Esses desvios foram objeto de pesquisas feitas por renomados pesquisadores, inclusive um psicólogo agraciado com o Nobel de Economia em 2022. Entender e reconhecer esses padrões é chave para evitar erros caros.
Viés de confirmação
Um viés bastante documentado é o de confirmação. Significa só enxergar aquilo que confirma suas convicções e foi evidenciado em um trabalho publicado em 1998 pelo professor Raymond Nickerson. Podemos perceber esse padrão quando torcedores, que outrora foram a favor da contratação de determinado jogador, tendem levar em conta apenas as jogadas bem-sucedidas que ele fez depois de contratado, ignorando aquelas em que ele errou, para confirmar sua aposta inicial.
No mercado financeiro, esse viés fica claro quando investidores desenvolvem uma tese de investimento e, para confirmá-la, tendem a buscar somente informações que corroboram com ela. Quem cai nessa armadilha costuma não considerar notícias e estudos que apresentam ressalvas ou riscos para aquela tese. A consequência é óbvia: prejuízo financeiro por alocar seu patrimônio com base em suposições tendenciosas.
Disponibilidade
Outro comportamento típico é o de julgar pelo que está mais imediato ou saliente na memória. Esse padrão foi documentado no trabalho “Disponibilidade: Uma heurística para julgar frequência” (tradução livre), publicado em 1973 pelos professores e psicólogos Kahneman e Tversky. Já viu alguém considerar um time, que andava mal, como favorito no campeonato por ter vencido os últimos 3 jogos? Acontece que um time vencer 3 partidas (e não mais que isso) seguidas no Brasileirão do ano ado é algo que aconteceu 24 vezes!
Isso também acontece quando se fala em bolsa de valores: alguns investidores costumam comprar uma ação porque dão muito peso para uma eventual valorização recente que tenha ocorrido, sem fazer uma análise fundamentalista. Isso leva a decisões equivocadas, baseadas em eventos isolados, e não em padrões consistentes.
Como evitar vieses?
Sabendo que essas armadilhas existem, como evitar esses vieses? A primeira dica é sempre buscar elaborar opiniões com base em fatos e dados. A subjetividade é uma dimensão importantíssima, mas a estatística deve ser usada nos casos em que emoções exacerbadas podem adicionar vieses à subjetividade. Nos investimentos, análises fundamentalistas devem prevalecer sobre "achismos". Também é preciso tolerância e consideração a outras visões, mesmo que contrárias, e reavaliar suas posições com alguma frequência, de olho nas novidades.
Tudo isso requer disciplina e não torna ninguém livre de equívocos, mas é essa disciplina que vai evitar que vieses levem a erros previsíveis. Não se trata de nos tornarmos robôs: subjetividade e emoções formam nossa identidade e também fazem a diferença. Há casos, entretanto, em que é preciso uma postura mais analítica e menos emocional, além de humildade para questionar as próprias convicções.