PROPAG

Leite, Castro e Caiado se juntam a Zema e endossam críticas a Lula por vetos em projeto da dívida

Depois das críticas dos governadores dos Estados mais endividados com a União; Pacheco afirmou que 'o momento é de agradecer a Lula pela sanção do Propag'

Por Lucyenne Landim e Gabriel Ferreira Borges
Atualizado em 15 de janeiro de 2025 | 12:09

BRASÍLIA - Outros três governadores se juntaram ao chefe do Executivo de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), nas críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelos vetos ao projeto de lei que renegocia as dívidas dos Estados com a União.

Estão na lista os governadores do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), e de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil). Juntos, os quatro Estados – incluindo Minas – respondem a cerca de 90% do total de R$ 765 bilhões devido por todas as unidades da federação. 

Castro afirmou que Lula “mutilou” a proposta e que a decisão foi “um duro golpe[...] para o país”, além de representar uma “quebra de acordo” firmado entre o Ministério da Fazenda e líderes do governo e da oposição no Congresso Nacional. 

“O federalismo brasileiro foi golpeado pelas costas”, declarou, acrescentando que o carimbo presidencial “mostra a total falta de compromisso com o diálogo institucional que tanto tem sido bradado quando interessa”. O veto ao uso do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) para abater a dívida, de acordo com o governador, “mata o programa”. 

“É sabido que, nos corredores do Palácio do Planalto, pessoas de baixo espírito público eram contra a sanção do Propag, alegando que esse projeto beneficiaria apenas os estados governados por aqueles que não apoiaram a eleição do atual Presidente da República. [...] É uma pena que seus conselheiros não tenham tido o espírito público de elevá-lo ao patamar de ser o primeiro presidente do país a realmente resolver, por definitivo, a dívida dos estados”, disse Castro a Lula. 

Já Leite afirmou que recebeu “com extrema preocupação e indignação” a decisão de Lula. De acordo com ele, os vetos “trazem um prejuízo inaceitável” para o Rio Grande do Sul e geram “uma perda de cerca de R$ 5 bilhões dos valores que deveriam ficar aqui para investimentos na reconstrução após as enchentes” de maio de 2024.  

“Com os vetos, para aderir ao Propag o Rio Grande do Sul fica obrigado a rear valores para um fundo, criado para compensar os Estados em melhor situação fiscal. Na prática, voltaríamos a rear valores à União, contrariando a suspensão da dívida pelo período de três anos, cujos valores estão sendo destinados ao Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs) para reconstrução”, disse.  

O governador gaúcho comunicou que já articula com a bancada do Estado no Congresso Nacional para que os vetos sejam derrubados - decisão que, se for aprovada pela maioria dos deputados e senadores, é soberana sobre a de Lula. A ideia também é defendida por Castro. 

Ainda de acordo com Leite, os vetos “representam um descumprimento inaceitável dos compromissos assumidos durante a tramitação do projeto de lei”. Não vamos aceitar esse descaso com o povo gaúcho, que tanto sofreu com a calamidade, e será novamente penalizado com essa medida do governo federal”, frisou.

Em entrevista ao O TEMPO Brasília, Caiado afirmou que “os vetos foram extremamente limitadores para que a gente possa ter uma melhoria do ponto de vista fiscal dos nossos Estados.

Ele declarou que houve articulação para "mostrar que não existe como você sobreviver pagando as parcelas de uma dívida quando o reajuste é em taxa Selic”. “Imagine bem, vo paga 15% de reajuste a partir de agora, de 2025. Não existe Estado capaz de poder minimizar a sua dívida”, disse. 

Segundo Caiado, havia um “processo de agiotagem montada” para ampliar cada vez mais as dívidas dos Estados”. “Sendo que as parcelas pagas em grande parte da arrecadação dos Estados, ela realmente se dissolvia ali e a dívida continuava crescendo. Quer dizer, você estava nadando contra a correnteza. Ou seja, mais você pagava, mais você devia”, completou. 

Zema 

O governador de Minas Gerais se manifestou na terça-feira (14), mesmo dia da decisão de Lula. Sem detalhar quais, Zema alegou que os vetos trarão um prejuízo de R$ 5 bilhões para os cofres públicos do Estado de Minas Gerais entre 2025 e 2026. “Apesar do recorde de arrecadação federal: R$ 2,4 trilhões em 2024”, criticou o governador, em uma rede social, cerca de dez horas após a sanção ser publicada no Diário Oficial da União.  

Zema ainda apontou que os R$ 5 bilhões seriam para “sustentar privilégios e mordomias” do governo Lula. “Enquanto os Estados lutam para equilibrar as contas, o (Palácio do) Planalto mantém 39 ministérios, viagens faraônicas, gastos supérfluos no (Palácio do) Alvorada e um cartão corporativo sem transparência. Até quando o contribuinte vai bancar essa desordem?”, emendou o governador.

Pacheco 

Autor do projeto, o presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), reagiu às críticas dos governadores. Por meio de uma nota, ele afirmou que “o momento é de agradecer” a Lula pela sanção e “aproveitar a oportunidade que os Estados terão para equacionar um problema histórico”.

“Por meio desse programa, o Governo Federal abre mão de receber juros, permite o alongamento da dívida em 30 anos e aceita receber ativos diversos como pagamento. É a chance de conciliar o pagamento efetivo da dívida com os investimentos que o estado precisa em diversas áreas, e sem impor aos servidores públicos os ônus injustos do RRF. Isso é bastante significativo e precisa ser reconhecido", concluiu. 

Sanção e vetos de Lula 

Após mais de um ano de negociações em Brasília, Lula sancionou, na terça-feira, o programa alternativo ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) para repactuar a dívida dos Estados com a União. Apadrinhada por Pacheco, a versão final do Programa de Pleno Pagamento (Propag) preserva a federalização de estatais, mas deixa de fora a utilização de um fundo criado pela reforma tributária para abater as dívidas.  

Por orientação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, Lula vetou a utilização de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) para abater a dívida com a União. O FNDR, que terá um aporte anual da União a partir de 2029, foi criado para compensar as perdas de arrecadação dos Estados com as alterações da reforma tributária. Enquanto 70% dos recursos serão distribuídos de acordo com os critérios do Fundo de Participação, os 30% restantes serão com base na população. 

A queda do FNDR é uma derrota para o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). A previsão dos recebíveis do fundo para abater a dívida dos Estados com a União foi incluída pelo relator do Propag no Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), ainda durante a primeira votação na Casa, a pedido de Castro. Ao justificar o veto, Lula afirmou que a medida seria inconstitucional, porque, de acordo com a Constituição, os recursos devem ser aplicados prioritariamente em sustentabilidade ambiental. 

A inconstitucionalidade foi o mesmo argumento adotado por Lula para vetar o abatimento de recursos utilizados pelos Estados em obras de responsabilidade da União entre 2021 e 2023. “(O dispositivo) Permite à União assumir obrigações de exercícios ados sem a formalização prévia de acordos, por meio de convênios, contratos de ree ou termos de parceria, o que geraria insegurança jurídica e resultaria em renúncia de receita, comprometendo o equilíbrio financeiro”, argumentou ele. 

O texto sancionado por Lula mantém o eixo principal da proposta de Pacheco, aprovada em definitivo pelo Senado há cerca de um mês, no dia 17 de dezembro. O Propag pode zerar a taxa de juros de 4% atrelada à dívida dos Estados com a União. Desde 2014, o saldo é corrigido pela taxa, mais o IPCA, ou seja, o índice da inflação. Os juros terão descontos de acordo com uma série de contrapartidas assumidas pelos Estados. 

Apesar de Haddad ter orientado Lula a vetar contrapartidas que impactassem o estoque da dívida dos Estados, o texto mantém a federalização de estatais, ideia considerada o cerne do projeto de Pacheco. Caso um Estado pague, com uma estatal, até 10% da própria dívida, a taxa de juros do indexador cairá de 4% para 3%. Às vésperas da sanção, interlocutores do senador avaliavam um eventual veto à federalização como uma “descaracterização” do Propag.  

Nessa segunda, Pacheco recebeu Haddad na Residência Oficial do Senado, ocasião em que o ministro da Fazenda garantiu ao senador que a federalização das estatais seria preservada. O encontro foi o primeiro entre os dois após Haddad ter adiantado que Lula vetaria trechos do Propag, o que teria surpreendido auxiliares do presidente do Congresso. Até então, eles trabalhavam com a hipótese de que o texto seria sancionado na íntegra. 

O texto sancionado por Lula ainda preserva o uso de recebíveis da exploração de petróleo, de gás natural, de recursos hídricos para geração de energia elétrica e de recursos minerais para abater a dívida dos Estados com a União. A federalização de recebíveis de créditos inscritos na dívida ativa das fazendas estaduais, confessados e considerados recuperáveis, também foi mantida no rol de ativos que podem ser oferecidos para quitar parte do saldo. 

Além da transferência de ativos, o Propag prevê outras contrapartidas para zerar a taxa de juros. Os Estados podem utilizar investimentos do serviço da dívida em áreas, como, por exemplo, educação e infraestrutura de saneamento, habitação, adaptação às mudanças climáticas, transportes e segurança pública, para derrubar 1,5 ponto percentual da taxa, e destinar o 1,5% restante para o Fundo de Equalização Federal.  

O Propag vai permitir aos Estados renegociar a dívida com a União em parcelas mensais por, no máximo, 30 anos. Minas, cuja adesão ao RRF foi homologada por Lula no último dia 6, por exemplo, terá condições especiais de pagamento nos quatro anos iniciais. Durante o período, a parcela da dívida vai corresponder, ano a ano, a 20%, 40%, 60% e 80% do valor integral até atingi-lo a partir do quinto ano de vigência do programa.